A APES divulga nota sobre a volta presencial às aulas. No documento, o sindicato faz uma análise do atual momento da pandemia, defende o passaporte vacinal, a possibilidade de manutenção do Ensino Remoto Emergencial no atual cenário de descontrole da pandemia, os protocolos de segurança sanitária e reafirma o seu compromisso histórico com a defesa da categoria, das condições de trabalho e da educação pública, laica, de qualidade, gratuita e socialmente referenciada. Acompanhe.
Ômicron e a Volta Presencial nas Instituições de Ensino Públicas
Fase atual da pandemia: Ômicron e seus riscos
A pandemia da Covid-19 desnudou as desigualdades sociais de modo mais amplo nas sociedades e de modo muito particular e profundo no Brasil. Observamos isso através das mais de 600 mil mortes pela doença, do aumento exponencial da pobreza e, também, no campo do acesso à educação, acometendo principalmente a população mais vulnerável e historicamente excluída. Em quase 2 anos de mudanças estruturais na vida por ação de um vírus, seguimos com a pandemia em curso, na medida em que o vírus segue sua natureza, que é a mutação permanente. Por mais estarrecedor que pareça, nós seguimos na luta contra as ações negacionistas intencionalmente disseminadas, como, por exemplo, a falsa ideia de que a nova cepa “mais leve”, a Ômicron, poderia significar o “fim da grande pandemia”.
Precisamos reafirmar que, após dois anos de pandemia, o que temos efetivamente é que a ciência deu a sua resposta, já que a vacina melhora significativamente as condições para enfrentar o vírus. Neste momento, em que a Ômicron avança no mundo e no Brasil, testemunhamos como a vacina reduz de forma consistente o número de internações e mortes, ainda que não garanta a imunidade completa ao vírus. Junto à vacina, mostram-se eficientes e necessárias as medidas não farmacológicas, como o uso de máscaras, higiene frequente das mãos e o distanciamento.
Sendo assim, ao debater o retorno das aulas presenciais nas instituições de ensino, este quadro deve ser a base de nossa análise. Neste momento, de explosão de casos de Covid-19 decorrente da Ômicron, que possui uma taxa de transmissão muito superior as cepas anteriores, o retorno presencial seria uma atitude irresponsável com a vida da comunidade de nossas instituições e da população onde elas estão inseridas. O retorno presencial neste momento acarretaria o aumento na circulação de pessoas, o que ampliaria as condições mais favoráveis para contaminação e ampliação da pandemia, com todas as consequências disso, como saturação do sistema de saúde, comprometimento do papel científico e social das nossas instituições, possível crescimento do número de pessoas doentes, ou mesmo, de ampliação do número de mortes.
O relaxamento das medidas de contenção da pandemia pelos governantes propicia a propagação descontrolada da Ômicron e trará enormes danos à sociedade. Até o momento, dois dados chamam a atenção e confirmam a preocupação de nossa entidade e da assembleia: 1) o número de pessoas internadas ou mortas até o momento é amplo entre aqueles que não estão vacinados ou estão com esquema vacinal incompleto e; 2) os dados divulgados pela UFJF mostram o aumento descontrolado de casos de Covid-19 entre a comunidade universitária, visto que, entre julho e dezembro de 2021, tivemos 63 casos na UFJF, e nas três primeiras semanas de janeiro de 2022, temos 133 casos. Em um contexto de funcionamento parcial das atividades presenciais, com um número reduzido de docentes, estudantes e técnicos(as) administrativos no campus, esses dados são extremamente preocupantes.
Manutenção do ERE e medidas de segurança sanitária para o enfrentamento da pandemia
Diante desse cenário, consideramos que o ERE é ainda uma medida necessária para a proteção de toda a comunidade da UFJF – professores e professoras; técnicos (as); estudantes.
É preciso ressaltar que, como vimos afirmando desde 2020, o ensino remoto tem caráter emergencial. Não podemos negar, contudo, que há uma disputa de projetos educacionais em curso. Neste contexto, o projeto que pretende ampliar a educação superior à distância, reduzir custos e desresponsabilizar o Estado com o financiamento da educação, busca se aproveitar da pandemia para ser validado. Portanto, resistir a isso é também debater como, quando e em que condições as instituições de ensino devem voltar de forma ampla com as atividades presenciais.
Em nota de esclarecimento publicada no dia 27 de janeiro de 2022, o CNE enfatiza que “é absolutamente necessário adotar providências, ainda que temporárias e de curto prazo, para garantir a segurança das comunidades escolares, estudantes, professores e funcionários, suas famílias e do conjunto da sociedade inclusiva” e que as “atividades pedagógicas não presenciais poderão, ainda, ser utilizadas de forma integral ou parcial nos casos de suspensão das atividades letivas presenciais por determinação das autoridades locais, ou de condições sanitárias locais de contágio que tragam riscos à segurança da comunidade escolar quando da efetividade das atividades letivas presenciais”.
Outro fato que não pode ser ignorado é que as instituições não estão em condições de se preparar de forma adequada para o retorno em função da asfixia orçamentária.
O retorno presencial deve estar vinculado ao debate sobre a dinâmica da pandemia, a adoção das medidas como utilização de máscaras eficientes e garantia de EPI para todos e todas, mudanças nas estruturas prediais das instituições, descentralização de refeitórios, bolsas de assistência estudantil, respeito ao distanciamento e utilização de espaços com ampla ventilação. E, além disso, a cobrança do passaporte vacinal obrigatório para assegurar as condições de proteção à vida.
Passaporte vacinal é medida de saúde pública para proteção à vida
O debate sobre o retorno às atividades presenciais suscita um aspecto fundamental relacionado com o quadro da vacinação. Lembremos que enfrentamos uma pandemia e que a vacinação é uma medida de proteção sanitária para toda a comunidade sustentada em duas dimensões: individual e coletiva. Se queremos retomar a vida comunitária, temos que lutar e cobrar essa medida de proteção para todos e todas. O denominado “passaporte vacinal” é uma medida de saúde pública, traz mais segurança ao ambiente de trabalho e permite a proteção coletiva, sendo, portanto, imprescindível frente ao momento atual. A vacina não evita o contágio em 100 por cento, mas potencialmente evita internações por formas graves da doença e mortes. Além disso, a universidade e os institutos federais são, por excelência, lócus de produção de ciência e conhecimento. Cobrar a confirmação de que a ciência prevaleça é dever das instituições.
O retorno presencial deve ser debatido com a comunidade acadêmica de forma ampla e transparente, considerando a defesa da vida e da ciência como pressuposto. Portanto, o passaporte vacinal e as condições sanitárias devem estar assegurados. Sabemos que a taxa de cobertura vacinal é baixa em muitos países e em algumas regiões do país. E caso essa realidade persista, novas cepas irão surgir e podem estar fora do alcance das vacinas que temos até agora. Então, manter medidas de proteção sanitárias coletivas segue sendo necessário.
O retorno também envolve a relação das IFEs com o MEC, este, atualmente dirigido por defensores e executores das mais severas e draconianas medidas de um governo de caráter genocida, que sistematicamente fez/faz uso de atos normativos, os quais precisam ser analisados e não cegamente cumpridos. Atos que violam normas superiores e constitucionais, retiram direitos e fragilizam garantias.
O argumento e a defesa intransigente da autonomia universitária, prevista na CF/88 (art. 207) são imperiosos e condição de sobrevivência das instituições como lugar de livre produção de conhecimento. Para ilustrar, no contexto da pandemia, o STF ordenou na ADPF 669/2020 a suspensão de campanha publicitária da União, “o Brasil não pode parar”, compreendendo que a campanha não observava princípios constitucionais da prevenção e da precaução (art. 225, CF). Tais princípios determinam, na forma da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, “na dúvida quanto à adoção de uma medida sanitária, deve prevalecer a escolha que ofereça proteção mais ampla à saúde”. Recentemente, na ADPF 756/2021 assegurou-se que “As instituições de ensino têm, portanto, autoridade para exercer sua autonomia universitária e podem legitimamente exigir a comprovação de vacinação, com fulcro no art. 3º, III, d, da Lei 13.979/2020”.
A decisão sobre retomada ou não das atividades presenciais nas Instituições de Ensino Superior Públicas, bem como sobre a adoção da obrigatoriedade de passaporte vacinal, precisa ser tomada no exercício da autonomia universitária, em diálogo com a ciência e em disputa do que seria uma decisão constitucionalmente orientada.
A APES segue contribuindo com o debate e reafirma o seu compromisso histórico com a defesa da categoria, das condições de trabalho e da educação pública, laica, de qualidade, gratuita e socialmente referenciada.