A APES realizou nesta sexta, 22 de outubro, uma live comemorativa e reflexiva pelo Dia dos Professores e Professoras, com um debate sobre o legado de Paulo Freire e uma apresentação musical.
Luciene Ferreira da Silva, diretora da APES, abriu a atividade, ressaltando como a data do dia 15 de outubro precisa ser marcada pela luta e pela resistência na atual conjuntura de aprofundamento do neoliberalismo e dos ataques à educação, com cortes orçamentários, cerceamento da liberdade de ensinar, perseguições políticas dentro das instituições e diversos tipos de intervenções externas. “É um momento em que a gente comemora nosso papel, nossa importância, mas também um momento para aprofundarmos nossa reflexão sobre os objetivos da nossa luta”, reforçou Luciene. Nesse sentido, a APES convidou a professora Jaqueline Ventura, docente da UFF, licenciada em Pedagogia, mestre e doutora em Educação pela mesma universidade, e o professor Rubens Luiz Rodrigues, docente da UFJF graduado pela UFF, mestre em Educação pela UFF e doutor em Educação pela PUC-RJ da UFJF, para debateram o tema “O legado de Paulo Freire e os desafios para a educação no contexto de aprofundamento neoliberal”.
Debate
Jaqueline Ventura iniciou a conversa ressaltando a singularidade e grandiosidade do pensamento de Paulo Freire, que produziu, ao longo de 40 anos, uma grande reflexão sobre a especificidade não somente do Brasil, mas das “sociedades silenciadas” em geral, como países da América Latina e da África. O maior legado freiriano, segundo Jaqueline Ventura, é a formulação de um pensamento problematizador, que deve ser situado no campo das pedagogias críticas. Estas contribuem para uma leitura da sociedade e de formação humana como algo histórico-social, e apresentam uma proposta de educação comprometida com os problemas concretos, não apenas no sentido de uma compreensão da realidade, mas também de sua transformação. Assim, segundo Jaqueline Ventura, a importância de Paulo Freire que permanece no presente é “trazer de maneira explícita que toda educação é um ato político. Que educar não é educar para, mas educar com, questionando matrizes de silenciamentos dos subalternizados que marcam a realidade histórico-social brasileira até hoje”.
Segundo Jaqueline Ventura, estamos diante de “pedagogias da crueldade”, forjadas na ampliação da miséria, no racismo, no sexismo, no ataque ao serviço e ao servidor público e no ataque à escola. Diante desse cenário, reler Paulo Freire é, segundo a professora, reivindicar a pedagogia libertadora como contraponto capaz de contribuir para a luta socialista, ou seja, em defesa da dignidade humana. “Em termos freirianos, superar a relação de aderência do oprimido ao opressor é tarefa da educação popular, no sentido de educação política”. Assim, para Jaqueline Ventura, precisamos fazer um trabalho de base – nas escolas, nos sindicatos – para desnaturalizar relações de opressão e perceber que o oprimido tem pauta própria, cuja compreensão precisa passar da consciência ingênua para a consciência crítica. “A luta contra a opressão deve ser tarefa do oprimido, da classe trabalhadora. E não para o oprimido, para a classe trabalhadora”, afirma a professora.
Em seguida, Rubens Luiz Rodrigues apresentou uma caracterização desta sociedade situada no aprofundamento do neoliberalismo. Segundo o professor, esta “é uma sociedade que busca: reordenar os Estados nacionais à uniformização econômica, política e social do que alguns autores denominam de mundialização do capital; redirecionar as políticas sociais dos organismos internacionais assumindo um posicionamento de adaptação do trabalho às exigências de produtividade, de competitividade, de qualidade total; colocar a perspectiva de formação pelo incremento individual de formação de capital humano, com centralidade na empregabilidade, no empreendedorismo, na resiliência, do trabalhador a partir das mudanças técnico-científicas; e busca se preocupar com uma governabilidade que requer o reajuste estrutural. Esse é o quadro que leva a uma intensificação da desigualdade, da exploração sobre os trabalhadores, da miséria, da fome.” Para Rubens Luiz Rodrigues, é neste contexto que educadores e educadoras precisam se referenciar para se posicionarem como aliados da classe trabalhadora nesta condição de crise, de barbárie e intensificação dos ataques que a burguesia brasileira, aliada aos interesses internacionais, coloca.
Segundo Rubens Luiz Rodrigues, este é um cenário de reforço a uma formação com base na meritocracia, que Paulo Freire sempre criticou, e que favorece ações de dominação, de não reconhecimento e de desrespeito sociocultural. Uma proposta que exalta as “pedagogias da competência”, centradas na aprendizagem em detrimento da produção do conhecimento e recusa o legado histórico-social da humanidade. Segundo o professor, embora em contextos diferentes, Paulo Freire sempre recusou a dominação, a exploração, a opressão, colocando os oprimidos – a classe trabalhadora – como protagonistas de uma ruptura com este contexto.
Para Rubens, a contribuição da apropriação freiriana reafirma a perspectiva emancipatória como um horizonte de um projeto humanista revolucionário, o que vai sustentar a teoria crítica de educação para a liberdade, anunciada nas obras do autor. Assim, como afirma o professor, a educação para a liberdade é pensada como formação integral e ilimitada dos homens. “Ilimitada no sentido que todos devem ser livres no seu processo de conscientização, de crítica e de compreensão da realidade. E integral porque o ser humano precisa ser mais, no sentido de se apropriar de toda a carga do conhecimento histórica da humanidade para que o homem possa elevar os seus sentidos humanos, para escutar a música, ver uma obra de arte, ler a filosofia, com os sentidos plenamente significativos para que a gente possa no caminhar de uma sociedade livre”, afirma Rubens Luiz Rodrigues.
Música
Para fechar o evento, Elmir Santos e Rodrigo Scafuto apresentaram canções brasileiras em um show no formato voz e violão. Elmir Santos é cantor, preparador vocal, educador musical, formado em canto popular pela Bituca Universidade de Música Popular e bacharel em música (canto lírico) pela UFJF. Rodrigo Scafuto é violonista, cantor e professor formado em violão e guitarra pela Bituca, bacharel em música (violão) pela UFJF e professor do Conservatório de Música.